Fernanda Pereira de Lorena*
Gosto da maternidade porque ela já começou me falando: “Linda, não adianta planejar ou esperar nada. Aqui vai ser tudo do meu jeito!”. Por isso compartilho aqui o relato do meu parto, quando aprendi isso de uma maneira um tanto quanto dura…
Minha gravidez não foi planejada. Minha vida ia muito bem, obrigada, até vir o positivo e virar tudo de cabeça pra baixo.
Eu estava no auge dos meus 25 anos, morando com minha mãe, há três anos e meio em um relacionamento bem sério – que graças a Deus sempre foi leve, respeitoso e gostoso – e com a carreira que eu sempre desejei, até um MBA na área eu já tinha terminado. Filhos? Ia pensar nisso só depois dos 30.
Até que em julho de 2016 o meu ciclo, que sempre foi um relógio, uma das únicas certezas que eu tinha na vida (rs), atrasou quatro dias. Comprei um teste por desencargo e fiz no banheiro do trabalho mesmo. Positivo! Após o maremoto de sentimentos, que levou alguns dias para ser absorvida e digerida, pensei: “Já que estamos aqui, vamos fazer esse negócio direito né?”
Começando pré-natal, fomos atrás de um dos médicos mais humanizados da cidade, afinal eu não queria cair numa cesárea desnecessária né? A identificação com este médico foi imediata. Era ele quem eu queria que me acompanhasse ao longo das 40 semanas e durante o parto.
Tive uma gestação relativamente tranquila – exceto na 23ª semana em que quase entrei em trabalho de parto prematuro e tive que fazer repouso de 15 dias mais uma infecção urinária na 26ª semana – e o Gabriel mexia que era uma beleza. Muita gente até se assustava com os pulos que minha barriga dava.
A partir da 30ª semana tomei vergonha na cara e iniciei o Yoga para gestante com a profissional que viria a ser minha doula. Na primeira aula o Gabriel já foi para posição cefálica. Ou seja, parto normal à vista!
E na 37ª começaram os pródomos (sinais que indicam que o trabalho de parto está próximo): contrações não ritmadas, às vezes com dor, às vezes sem dor, barriga abaixando e tampão saindo. Nas consultas semanais o obstetra afirmou que o colo estava cada vez mais fino e já havia alguma dilatação – a hora estava chegando!
No dia em que chegava a 39ª semana, por volta das 22 horas, começaram contrações a cada 10 minutos – e que não paravam. Por volta da meia noite acordei meu namorado e ele ainda achava que seria importante esperar antes de acionar médico e doula. Até que fui ao banheiro por volta da 1h e tive um sangramento! Tinha chegado a hora!
Avisamos médico e doula e monitoramos por mais um tempo até que às 4h30 estávamos no hospital dando entrada. Primeira avaliação: 4 a 5 cm de dilatação, líquido ok, fomos para a sala do Parto Adequado.
As contrações já estavam com intervalos de 3 minutos, mas totalmente suportáveis. O apoio da doula foi FUNDAMENTAL para atravessar todo esse período. Muito chuveiro, massagem e conversa – inclusive nos intervalos das contrações o papo rolava solto – e o meu namorado sempre ao meu lado, segurando a minha mão quando o negócio apertava. Foram horas muito gostosas e que hoje eu lembro com saudade, foi tudo muito leve e eu nem via o tempo passar. Não sofria e nem encarava aquela dor como sofrimento.
Nas avaliações, a dilatação estava sempre aumentando, mas um ponto preocupava o obstetra: o Gabriel não estava baixo o suficiente e o rostinho dele estava virado para o lado errado. Então, bora lá fazer mais exercícios pra abaixá-lo e fazê-lo ficar na posição certa.
As dores foram ficando cada vez mais fortes e com nove centímetros o obstetra optou por romper minha bolsa para ajudar o bebê a descer. Foi um dos momentos mais dolorosos do meu trabalho de parto, uma das poucas vezes em que eu urrei de dor.
E então chegava o expulsivo… uma vontade imensa de empurrar e empurrar e empurrar, algo fora do normal. E nada.
O obstetra me examinou e tentava virar a cabeça do Gabriel, mas ela voltava para a posição errada. Mais força, mais tentativas – de virar a cabecinha dele também – e nada. Então, aproximadamente 12 horas após o início do meu trabalho de parto (só depois de uns três dias eu percebi que fiquei DOZE HORAS no hospital em TP) – que estava na reta final – a recomendação foi a cesárea.
Eu estava exausta e pensei: bora lá então! Não era o desfecho desejado, mas ter chegado aos 10 cm, sem anestesia, ter passado por todo o processo, já tinha sido uma grande conquista pra mim.
E assim, às 18h08 do dia 25/03 o Gabriel veio ao mundo – com três circulares de cordão no corpo, ou seja, por isso a cabeça dele não se posicionava direito! Sofri bastante no pós-operatório com efeitos adversos da anestesia e não tive a tal da golden hour (primeira hora de vida) com meu filho.
Fui vê-lo somente umas 23 horas (do centro obstétrico só me lembro do cheiro e da textura dele), mas nada disso foi impedimento para termos um início de aleitamento maravilhoso e sem mais dificuldades.
Hoje eu me pergunto como é que tem mulher que tem coragem de marcar cesárea. Fui parar de sentir dores no local da cirurgia por volta de um mês pós-parto. Sofri bastante no puerpério (tema para outro texto) e considero que meu parto foi o primeiro tapa na cara que a maternidade me deu, seguido do puerpério.
Minha experiência de parto não teve o desfecho esperado, mas foi sensacional e inesquecível. O que eu gostaria é que todas as mulheres pudessem ser respeitadas assim como eu fui, em um momento tão delicado. Os primeiros dias da maternidade já são tão difíceis, ter que lidar com isso depois de sofrer violência obstétrica, por exemplo, só piora esse cenário.
Independentemente da via de nascimento, um parto precisa ser respeitoso para mãe e para o bebê.
Ah, e o mais importante: esteja preparada para todos os cenários.
A gente lê muito relato lindo de parto humanizado, mas pouquíssimos de mães que tinham tudo para ter normal e tiveram que ir para a cesárea – tanto que quando me perguntam qual foi o parto, eu nunca sei o que responder (risos). É uma intervenção cirúrgica que, apesar de seus riscos, salva muitas vidas.
Provavelmente, eu não estaria aqui contando meu relato se não fosse a cesárea. Mas lidar com a frustração de chegar na cara do gol e bater na trave é bem difícil e é algo que deve estar na preparação para o parto, porque faz parte da maternidade o tempo todo.
* Fernanda Lorena, mãe do Gabriel. É jornalista, leonina, mora em Santos (SP) e está contando as horas para o verão chegar e poder levar o Gabriel na praia.
Crédito da foto principal: Arquivo pessoal