Paula*

Era casada há dez anos com um príncipe encantado, acreditava ser uma mulher feliz e tinha uma família de comercial de margarina.

Nunca dormíamos brigados. Resolvíamos nossas desavenças com bastante conversa.

Um dia, discutimos por uma coisa tão corriqueira, que nem lembro o porquê. Foi quando, pela primeira vez, ele me apertou o braço de uma maneira tão forte, que precisei usar mangas compridas por uma semana.

Passou. E nos entendemos.

A mesma coisa aconteceu pela segunda vez. Depois, pela terceira.

Pensei em pedir o divórcio, mas tínhamos dois filhos, com seis e dois anos na época.

Sempre fui independente e não costumava recorrer à família, para compartilhar meus problemas…

Aliás, seria a primeira divorciada da família.

Continuei casada.

A pressão

Ele sempre dizia que eu nunca iria encontrar um homem que me amasse tanto como ele. Eu acreditava.

Ele dizia que eu nunca daria conta sozinha, até porque, “uma workaholic como eu, não cuidava nem da casa nem das crianças”. Aliás, ele estava desempregado há cinco anos. Era o “dono de casa”. E eu a provedora financeira. Eu acreditava.

Ele dizia que eu parecia uma prostituta ao fazer as unhas, ao passar batom, ao usar vestidos, ao soltar os cabelos. Eu acreditava.

A outra

Foi quando descobri uma amante e fui questionar.

Acordei com os cabelos todos arrebentados, um olho roxo, o corpo cheio de hematomas e três costelas quebradas.

Logo eu, menina de família estruturada, mulher independente, graduada e pós graduada, empresária, com um 7º lugar em concurso público.

Depois disso, quebrei a minha promessa com Deus e não esperei a morte nos separar.

A vitória

Hoje, me libertei de um peso que, confesso, carregava sem saber.

Faço as minhas unhas e passo meu batom, sem me preocupar com o que vão pensar de mim.

Uso as roupas que gosto, que se adéquam ao meu corpo e me fazem feliz. Não mais as capinhas de botijão de gás.

Não queria ter passado por tudo o que passei, nem desejo isso a ninguém.

Por alguns momentos, faltou-me coragem.

Mas hoje enfrento tudo: trabalho, filhos e, sabe do melhor? Dou conta de tudo sozinha.

Não precisei voltar pra casa dos meus pais.

As crianças continuam com a rotina que tinham, mas agora em casas separadas. A única coisa que ainda não tive coragem é de desfazer a imagem de herói que eles têm do pai, mas acho que isso não cabe a mim.

O grito

Por meses, pensei em postar tudo no Facebook, como desabafo e para orientar outras mães, mas zelo pelas crianças que não sabem de nada…

Queria de alguma forma ajudar as pessoas.

Sei que muitas mulheres estão passando por esse tipo de violência agora. Não sou a única, infelizmente.

Obrigada por me ouvir. Eu precisava desabafar com alguém.


Em respeito às crianças, o nome verdadeiro da mãe e autora deste texto não será divulgado.

Crédito das fotos: pixabay.com

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