A maternidade é uma coisa muito louca. Bizarra até!

Minha pequena tem três anos, mas às vezes ainda acho que estou no puerpério.

Eu amo ser mãe. Curti cada momentinho, desde o dia em que fiz o teste de farmácia. Mas o puerpério e a maternidade em si são uma loucura.

Tento levar as coisas com mais leveza, mas, de vez em quando, me permito enlouquecer (rsrs).

Como tudo começou

Minha gravidez foi tranquila, na medida do possível.

Eu vinha de um princípio de endometriose e não esperava engravidar tão rápido.

Engravidei pouco mais de um mês depois da primeira tentativa.

Fizemos tudo muito direitinho. Exames, vacinas, dieta, mas no primeiro morfológico nosso mundo se abalou um pouco: Foi constatado o aumento da nuca, que pode ser sinal de alguma alteração genética… ou não (rs).

Fomos encaminhamos a um especialista em medicina fetal, que nos deu 15% de probabilidade de a bebê ter Síndrome de Down (SD).

O caminhar

Isso abalou muito nossa vida, mas – conforme fomos fazendo os outros exames e vimos que ela estava bem –, fomos relaxando e curtindo cada momento. Na verdade, fomos contando com os 85%… que são bem mais que 15%, né?

No dia do parto, nem nos lembrávamos da probabilidade da Síndrome de Down.

Mesmo assim, ela se confirmou.

E junto com a SD, veio também uma anomalia anorretal. Nossa bebê nasceu sem o ânus, teve de ir pra Unidade de Terapia Intensiva (UTI), fez a cirurgia de reconstrução e ficou tudo bem depois de 16 dias intermináveis no hospital.

No fim, acho que esse tempo foi importante para assimilarmos aquele mundo novo que surgiu na nossa frente.

A aceitação

Foi difícil entender tudo isso.

Uma mistura louca de sentimentos. Raiva. Tristeza. Medo. Amor. Remorso por sentir raiva e tristeza…

É um luto mesmo! Porque aquele bebê que você idealizou durante as quase 40 semanas foi “tirado” de você.

A pergunta “por que eu?” é inevitável.

Aí você reflete e passa a se perguntar “por que não eu?”. “O que eu tenho de melhor ou pior que fariam com que eu não passasse por isso?”.

Acontece. As coisas nem sempre saem como planejamos, mas quando você está dentro da situação e encara de peito aberto, tudo fica mais leve.

Choramos muito nos primeiros dias, mas quando a dor passou, pensamos: “Ok. E agora a gente faz o que, para que ela cresça com saúde e se desenvolva bem?”

E aí, depois do luto, você vai à luta! É clichê, mas é bem assim.

Os desafios

O nascimento da Bee (como carinhosamente chamamos a Ana Beatriz desde a barriga) trouxe milhares de dúvidas e desafios.

Tenho sorte por ter um pai incrível comigo, que sempre dividiu tudo! Ele não dividiu a barriga e o peito, mas todas as outras coisas fizemos juntos.

Especificamente no nosso caso, as dúvidas que surgem são todas relacionadas à Síndrome de Down. Depois, percebemos que são dúvidas comuns à maioria dos pais. Até porque ela sempre foi um bebê como qualquer outro.

As mudanças

Não mudamos nada em nossos planos, porém, fizemos algumas adaptações neste ano.

A Bee ficou com os avós até os dois anos e meio, mas estava na hora de ir pra escola.

E esse foi um ponto tenso para nós, porque a questão da inclusão sempre foi um dos nossos grandes medos.

A sorte é que encontramos uma escola incrível, que se encaixou nas nossas expectativas de maneira perfeita.

Só que pelo horário do colégio, tivemos de mudar um pouco nossa vida profissional.

Sou repórter de rádio e trabalho em uma agência de notícias em São Paulo. Meu marido é servidor da Prefeitura de São Paulo e também trabalhava na capital. Ele pediu transferência pra o Itaim Paulista e eu mudei meu horário de trabalho na agência.

Foi assustador ter de enfrentar essas mudanças, mas agora que tudo vai se encaixando vemos que foi a melhor escolha.

O desenvolvimento da nossa menina está ótimo e ela ama a escola!

A sociedade

Preconceito é algo que existe e sempre vai existir.

Na prática, aprendemos que o preconceito, às vezes, é algo tão sutil que passa batido.

Não tivemos nenhuma situação explícita ou cruel. Mas alguns olhares, algumas expressões não negam que ele existe…

Costumo dizer que todos temos preconceito de alguma coisa em algum nível. Eu tinha os meus com relação à Síndrome de Down.

Quando a Bee nasceu, o preconceito me encarou e tive que enfrentá-lo.

Esse “preconceito sutil”, que é gerado por falta de conhecimento, relevamos. Mas tento esclarecer quando a pessoa fala algo errado, enfim…

Por enquanto, estamos levando numa boa e não tivemos nenhum episódio pesado. Mas sabemos que um dia pode acontecer. Confesso que não sei como reagiria…

Os aprendizados

A maternidade vem me ensinando muito! A ser mais paciente, tolerante, a ter mais empatia, a ser uma pessoa melhor… Porque não posso querer um mundo melhor pra Bee, se eu não começar sendo melhor.

Sem contar que é muita responsabilidade ter que educar alguém do zero, levando em conta a personalidade e as vontades desse alguém (rs).

O que eu acho importante, no meu caso, é que a maternidade não me transformou em outra coisa.

Vejo muitas mulheres que se transformam em mães e passam a ser só mães.

Acho que consegui incorporar a maternidade como mais uma característica da minha vida, e isso, por si só, já facilita ter de lidar com as dificuldades e obrigações da maternidade.

Aqui, acho importante ressaltar a participação do pai da Bee. Vendo outras mães por aí, percebo que um pai ativo, que divide tudo (já que ele é pai tanto quanto a mãe é mãe) facilita e deixa a coisa fluir com naturalidade.

Tenho consciência, no entanto, que somos exceção de uma regra ainda muito cruel de uma sociedade machista e patriarcal, que joga todo o peso da maternidade para a mulher.

Não pire!

Posso falar com propriedade sobre a Síndrome de Down: Não é fácil, mas não é tão difícil quanto parece.

Repito que a criança com SD é uma criança como qualquer outra.

Uma coisa que a pediatra dela nos falou, logo na primeira consulta, foi para curtirmos cada momento, porque ela era um bebê e o tempo passa muito rápido.

O que recomendo para outras mães, que passam pela mesma situação que passei é: Pesquise, mas não pire na quantidade de informações que vai achar.

A estimulação precoce é essencial e estarmos cercados de bons profissionais vem fazendo toda a diferença no desenvolvimento da Bee.

Por outro lado, vejo que tudo isso não adianta se não tiver aceitação. E isso é uma coisa muito pessoal…

Ana Paula da Costa Gaspar é radialista, mãe da Bee (Ana Beatriz da Costa Gaspar), e esposa do melhor pai que já viu passar por esse mundo: Carlos Roberto Gaspar Jr.


Crédito da foto em destaque: Sidnei Tavares

Mais informações

Três vivas para o bebê! – Guia para mães e pais de crianças com síndrome de Down – Cadernos Movimento Down.

Legislação e Direitos das Pessoas com síndrome de Down.

Cuidados de saúde às pessoas com síndrome de Down.

Movimento Down.

Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down.

Fundação Síndrome de Down.