Fazer o autoexame e ser acompanhada periodicamente por um ginecologista pode fazer toda a diferença na sua vida

O Outubro Rosa* está aí para fazer refletir sobre a prevenção do câncer de mama, mas também para alertar sobre a importância de manter os exames de rotina em dia. No pré-natal, corremos para o consultório médico nas datas certas, porque queremos ouvir o coraçãozinho do nosso bebê e acompanhar cada detalhe para que o parto corra bem. Sim, e isso é fundamental. Mas, depois que o bebê nasce, apesar da falta de tempo, das correrias diárias, o cuidado da mulher com o corpo e a saúde deve continuar.

De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (Inca), o câncer de mama é, relativamente, raro antes dos 35 anos. Acima desta idade, sua incidência cresce progressivamente, em especial, após os 50 anos. Isso, no entanto, não significa que as mais novas devem se descuidar.

Dados do Inca apontam também que, o câncer de colo do útero, facilmente identificado pelo exame Papanicolaou, é o terceiro tumor mais frequente na população feminina, atrás do câncer de mama e do colorretal, e a quarta causa de morte de mulheres por câncer no Brasil.

Nessa entrevista, o médico ginecologista e obstetra Carlos Eduardo Amaral Gennari, com mais de 40 anos de atuação na área, faz recomendações, fala sobre os exames de rotina e por que não podem ser deixados de lado, assim como os métodos contraceptivos, explica sobre como a gravidez e a amamentação podem reduzir as chances do câncer de mama, entre vários outros assuntos. Confira!

Direto do Nosso Jardim: Após o parto, a maioria das mulheres retorna ao consultório para exames de rotina?

Dr. Gennari: Sim, a maioria das minhas pacientes retorna ao consultório. Fazemos o pré-natal, a assistência ao parto, depois – habitualmente – quando terminam os 40 dias de dieta, a paciente retorna para fazer o exame de rotina, receber a orientação contraceptiva e, depois disso, a grande parte delas continua fazendo suas rotinas anualmente. Além disso, para garantir que essas mulheres não se esqueçam dos seus exames, utilizamos algumas ferramentas, como SMS, para lembrá-las.

Porém, isso é o que vivencio aqui no consultório e que compreende apenas uma amostra da realidade. Um dos grandes problemas que se tem na rede pública, por exemplo, é que, muitas vezes, as mulheres faltam no pré-natal e não fazem o acompanhamento correto nem durante a gestação e nem depois. Grande parte não volta para a consulta depois do parto, não procura saber como está sua saúde e, por isso, não recebe a orientação contraceptiva, principalmente, no caso das adolescentes. Por isso, que muitas engravidam de novo, depois de um ou dois anos. E isso não é por falta de apoio do governo.

Estão disponíveis gratuitamente pílulas e camisinhas. Existem profissionais capacitados para orientar. O que acontece é desinteresse mesmo. Hoje, sabe-se que o ideal, para o organismo da mulher, é que a diferença de idade entre dois filhos não seja menor do que dois anos e nem maior do que cinco anos.

DNJ: Qual o grande prejuízo disso?

Dr. Gennari: Se não faz os exames de rotina, aumentam as chances de ter doenças sexualmente transmissíveis e até um câncer de colo do útero. Além disso, se não busca orientações sobre métodos contraceptivos, pode ter sim uma gravidez indesejada.

DNJ: Como o câncer de colo do útero é identificado?

Dr. Gennari: Pelo Papanicolaou. O câncer de colo do útero é o único câncer para o qual existe prevenção. Em todos os outros, o que existe é o diagnóstico precoce, mas eles só são descobertos depois que já se encontram instalados. Agora, com o Papanicolaou, é possível encontrar essas células antes que elas invadam o organismo. Entre uma lesão intracelular inicial, que seria o início do câncer, até ser um câncer invasivo, são cerca de dez anos. Hoje, a incidência desse câncer ainda é alta, mas ele já foi, há algumas décadas, o câncer que mais incidia e matava as mulheres. Hoje, o principal, é o câncer de mama.

DNJ: Então, esses casos ainda existem porque as mulheres estão faltando nas consultas e não fazendo seus acompanhamentos básicos…

Dr. Gennari: Sim, muitas ainda não fazem o Papanicolaou rotineiramente. Também agrava esse cenário, ter muitos parceiros e ter o início da vida sexual muito cedo – antes de estar realmente preparada para isso. Dessa forma, ela vai ter uma chance maior de se contaminar com o HPV (sigla em inglês para papilomavírus humano), que pode evoluir para o câncer.

É importante dizer que a grande maioria das mulheres sexualmente ativas tem contato com o HPV ao longo da vida, só que elas mesmo, sozinhas, acabam com ele. Porém, se ela começa a ter muitos parceiros, se ainda é muito jovem, se fuma, se usa outros tipos de droga, vai tendo uma suscetibilidade maior para que esse HPV se perpetue e vá para o colo do  útero.

 

Nessa questão, a vacina contra o HPV é uma importante aliada?

Dr. Gennari: Sim. É fantástica, mas poucas meninas e meninos foram tomar vacina. E é de graça. É uma vacina que previne o câncer. Nem assim, todos fizeram a vacinação. Lembrando que ela deve ser aplicada em meninas e meninos a partir de nove anos de idade. No menino, esse tipo de câncer não tem tanta incidência porque é mais visível para se identificar;  ele, no entanto, atua mais como transmissor do vírus de uma mulher para outra, por isso, também é alvo da vacina.

DNJ: E o câncer de mama?

Dr. Gennari: Esse é, em sua grande maioria, o câncer da mulher já da quarta década de vida em diante, que deve fazer sua mamografia de rotina. O Outubro Rosa vem para “abrir o olho”, para alertar a mulher e lembrá-la de fazer a mamografia. Hoje, praticamente, 80% dos casos de câncer de mama são tratáveis – inclusive na rede pública. Isso, claro, se identificado precocemente.

DNJ: Amamentar pode mesmo reduzir as chances de um câncer de mama?

Dr. Gennari: Na verdade, é a gravidez que reduz as chances de um câncer de mama, até porque a mama só atinge seu desenvolvimento máximo após a primeira gestação. Assim, a mulher que tem uma gravidez até o fim atinge sua proteção.

Da mesma forma, enquanto a mulher amamenta, ela não ovula, então, essa mama não fica submetida a estímulos (estrogênio/progesterona), o que também é positivo para o organismo. E é claro que, se você amamentar dois anos, não vai ovular durante esse período, não vai menstruar e vai proteger sua mama. Mas, não é o ato de amamentar que reduz as chances de um câncer de mama, é a parte hormonal. Além disso, mesmo a mãe que amamentou deve manter seus exames de rotina, inclusive a mamografia, após os 40 anos.

DNJ: Já que estamos ainda durante o mês de Outubro, durante a campanha Outubro Rosa, qual mensagem deixa para as mulheres sobre isso?

Dr. Gennari: Que todas elas se conscientizem que são realmente muito importantes; se não existissem, não haveria mães, nem a humanidade. Elas são o esteio da humanidade. Casa que falta mãe, não tem casa, não tem lar. Por mais que nós, homens, tentemos fazer o que vocês fazem, não somos mães. Vocês são importantes. Por isso, que, nós, ginecologistas, e a própria saúde pública, tenta mostrar a vocês a importância desses eventos.

Se você tem mais de 40 anos, vá fazer a sua mamografia. Não adianta outro tipo de exame. Só ela possibilita um diagnóstico precoce do câncer de mama. E também não se esqueça de que o Papanicolaou é importantíssimo e que você deve reportar ao seu médico tudo que sai da rotina. Cólicas, por exemplo, não são normais. Então, se cuide. Nós, homens, crianças, o mundo… todos precisamos de vocês.

Dr Gennari
Crédito: Arquivo pessoal.

Dr. Carlos Eduardo Amaral Gennari é ginecologista e obstetra. Especialista em Ginecologia e Obstetrícia pela Associação Médica Brasileira; especialista em Cirurgia Geral pelo Conselho Federal de Medicina. Integra o time de palestrantes dos laboratórios Janssen Cilag, Bayer Schering, MSD Organon, Zodiac, EMS e Grunenthal. É representante credenciado da Associação de Obstetrícia e Ginecologia do Estado de São Paulo (Sogesp), em Mogi das Cruzes, e médico parceiro da Criogenesis (especializada na coleta e armazenamento de células tronco). http://www.doutorgennari.com.br/


* O Outubro Rosa é um movimento internacional que começou na década de 1990, nos Estados Unidos. Ocorre todos os anos durante os meses de outubro e tem como objetivo alertar sobre a importância da prevenção e do diagnóstico precoce do câncer de mama. De acordo com o Inca, o câncer de mama é o tipo mais comum entre as mulheres no mundo e no Brasil. Depois do câncer de pele não melanoma, o de mama responde por cerca de 28% dos casos novos a cada ano. Ele também acomete homens, porém, segundo o Inca, a incidência é bem pequena, representando apenas 1% do total de casos da doença.

Outras informações:

Câncer de mama

Câncer do Colo do Útero 

Papanicolaou

HPV e câncer – Perguntas frequentes

Qual a diferença entre o exame de Papanicolaou e o exame de HPV?

 


Crédito da foto em destaque: Pixabay